sábado, novembro 26, 2005

dois em um


numéricos


Dezoito mil setecentas e vinte voltas rápidas.
Daquelas ligeiras. Daquelas sem paradas.
Trezentos e doze círculos completos e perfeitos.
Espiral crescente de tempo.
Espiral crescente de sofrimento.
Treze vezes abrir os olhos.
Treze vezes fechar os olhos.
Treze vezes o infinito de interrogações.
Treze, sempre treze.

Agora, cento e setenta e dois mil e oitocentos momentos prazerosos.
Voltinhas espiralescas, circunferenciazinhas.
Bolinhas, borbulhas, gases nobres e plebeus.
Cento e setenta e dois mil e oitocentas vezes, repito.
Voltas rápidas, daquelas ligeiras, daquelas sem paradas.

São dois mil oitocentos e oitenta.
De círculos completos e perfeitos e de prazer.
Espiral ascendente do espírito.
Espiral ascendente de conhecimento.

Cento e vinte vezes abrir os olhos.
Cento e vinte vezes fechar os olhos.
Cento e vinte vezes o infinito de possibilidades.
Cento e vinte portas, entre abertas e fechadas.
Cento e vinte combinações de janela com porta.
De porta com janela. De porta com porta. De janela com janela.

Bolhas transparentes.
Circunferências transparentes.
Trezentos e sessenta chances e graus.
Trezentos e sessenta cores e notas.
Sessenta tempos.
Sessenta fragmentos de tempos.
Sessenta fragmentos de sofrimentos.
Sessenta vezes o infinito de incertezas.
Sessenta avos da vida em esperanças.
E o coração ganhando da matemática.


mono


Não tem continuação. Não é continuação.
Cada coisa é uma, em si, solitária.
Cada ser é um, em si, solitário.
Tudo pode ser de uma monotonia hilária.
Tão tão tão monótono de se acabar de rir.
Gargalhadas ecoam pelo espaço afora.
E adentro, nas enormes caixas torácicas.
Gigantes pela própria natureza.
Gigantescas ilusões de ótica e de querer.
Ai ai, que não se sabe mais quem vem de onde.
Quem é o quê, quem e porquê é assim.
Ou assado. Ou Beltrano. Ou Cicrano.
E, principalmente, Fulano.
Aí fica monótono de novo.
Tão tão tão monótono de se acabar de rir.
E lágrimas escorrem misturadas com soluços.
E confundidas com choro.
Não! Não se chora aqui. Aqui se ri.
Se ri de monotonia. Se ri de culpa. Se ri de absurdo.
Mas é sempre e impreterivelmente proibido chorar,
Que é coisa feia e indigna.
É coisa de quem não acha graça na monotonia.
Essa monotonia hilária.
Essa que existe em cada coisa.
Essa que existe em cada ser.
Essa que existe em cada solidão.
E que sufoca de riso e de eternidade.
E que dá soluços confusos, daqueles que parecem choro.
E que quase mata. Mas não mata.
Porque a morte não é monótona.
A morte é radical e feminina e dinâmica.
A morte não se ri. A morte não se confunde.
Só a monotonia confunde soluços com choro.
Só a monotonia, daquelas hilárias, mata de rir.
E confunde Cicrano com Beltrano.
E confunde com Fulano.
E confunde solidão com tristeza.
E confunde risos abertos e sorrisos amarelos.
E tudo fica preto e branco.

sábado, novembro 05, 2005

o senhor me arruma uma nicotinazinha, pelo amor de deus...?

Após recaída fantástica, volto firme e forte à tentativa no quesito "parar de fumar". Estou que não me agüento. Se conseguir passar incólume, sem nenhum homicídio culposo, doloso, chocoso ou choroso nas costas, ok. Acho que consigo chegar lá.
Tom acaba sofrendo um grande risco ao meu lado. Os ataques, as crises variam. Às vezes é uma necessidade sexual incontrolável (inegavelmente uma tentativa de substituir um prazer pelo outro, claro). Outras vezes é uma ânsia de fazer alguém sofrer lentamente, com requintes de crueldade.
Ai ai, ando com medo de mim mesma... mas, tô conseguindo. Com ajuda de deus, do diabo a quatro e do Santo Nicorette (padroeiro dos ex-fumantes desesperados) chego lá.
Torçam por mim (e por Tom, afinal o risco de ser assassinado é todo dele)!

terça-feira, novembro 01, 2005

feriado (quase) na finlândia


Era 12 de outubro, dia de Nossa Senhora de Aparecida, padroeira do nosso Brasil. Conseqüentemente, em se tratando do maior país católico do mundo, era feriado. E, para completar o quadro, era um dia que acabava de amanhecer absurdamente ensolarado, aqui na cidade maravilhosa.

Dia completamente convidativo ao passeio, à descoberta de novos lugares, às aventuras declaradas. Eu e Tom, sempre à procura de alternativas de divertimento, de entrarmos em equilíbrio e sintonia com esses dias estupidamente belos, nos arrumamos cedinho, enfiamos uma camiseta, uma roupa de baixo e escovas de dente na bolsa e rumamos para a Rodoviária Novo Rio, com o objetivo único de responder à pergunta: o que fazer no feriado?
Chegando à rodoviária você se depara com uma infinidade de guichês com passagens pra tudo quanto é lugar do Rio, do Brasil e até pra fora do país, como Buenos Aires, Montevidéu, Assunção, Santiago. Como o tempo era curto e o dinheiro também não era lá muito longo, limitamos a nossa lista de possibilidades para lugares próximos, que não nos tomasse mais de 3 horas na estrada e que não nos custasse uma fortuna, nem na passagem e nem na manutenção de vida durante a viagem. Isso nos limitou a destinos praticamente dentro do estado e na região serrana, já que as praias nesses feriados de céu azul são praticamente proibitivas de tão cheias. E, como já é sabido pelo povo que nos conhece e acompanha, nossa praia é montanha mesmo.

Pensamos em algumas possibilidades, mas o que acabou nos fazendo resolver mesmo foi o tempo de espera que teríamos na rodoviária antes do ônibus sair. Eu olhei, olhei, olhei e pimba! Apontei no quadro de avisos: vamos para Penedo!
Tom, esse meu adorável gringo doido, topou na hora. Compramos o bilhete e ficamos zanzando pela Novo Rio mais uns 40 minutos, o suficiente para chegar a hora de embarcar rumo ao nosso destino.

Está claro que já tinha ouvido falar várias vezes em Penedo, mas apenas ouvido falar. Sabia que era perto de São Paulo, sabia que era um lugar frio (no inverno, que fique claro. Nessa época do ano pode ser infernal), tinha ouvido em algo relacionado a fábricas de chocolate (falou em chocolate, meu cérebro rapidamente retém a informação), mas nada além disso.

A ida aconteceu em um agradável e espaçoso ônibus com ar condicionado da empresa Cidade do Aço, fazendo da viagem um evento tranqüilo e gostoso. O ônibus passa por Resende, no Shopping Graal que é, na verdade, uma rodoviária mais bem transada, antes do destino final. De lá para Penedo são mais, no máximo, 15 minutos de viagem. Foi justamente nesse curto percurso final que tive a primeira surpresa. O senhor, realmente de aparência pouco brasileira, que estava sentado à nossa frente, ouvindo algumas palavras proferidas por meu Tomzinho e por mim durante a nossa habitual aula de inglês (essa aula acontece nos lugares mais insólitos: no metrô, no trem, no Morro da Urca, no Shopping Rio Sul e, bem, dentro do ônibus com destino a Penedo), se virou e perguntou, em um inglês bastante carregado, se o ônibus realmente ia pra Penedo. Tom respondeu que sim e fomos esclarecidos que ele era finlandês, que sempre vinha de passeio ao Rio e que ia, pela primeira vez, conhecer a colônia finlandesa de Penedo. Epa, colônia finlandesa!? Surpresa total.

E é justamente esse espírito de colônia européia, de lugar frio, que você encontra assim que chega na cidade. Todas as construções lembram chalezinhos, tudo feito de madeira, um ar aconchegante, lojinhas com artesanato típico, trutas e chocolate, muito chocolate. Tudo isso aliado a uma temperatura de... bem, digamos que tínhamos uma temperatura nada nórdica de aproximadamente uns 35º. Mas, fora esse pequeno detalhe térmico, podemos nos sentir transportados pra algum lugar distante do nosso Brasil.

A colônia finlandesa foi iniciada nessa área no início do século vinte, por um grupo de idealistas daquele país, que pretendiam viver a vida de forma muito natural, sendo vegetarianos e comendo daquilo que plantavam. É claro que ser vegetariano e plantar para comer em um país onde boa parte do ano é inverno e com temperaturas absurdamente baixas é humanamente impossível. Assim resolveram procurar uma terra em outro país onde pudessem se estabelecer e concretizar, finalmente, os seus sonhos e ideais. Encontraram essa área onde se encontra hoje Penedo e, por uma inspiração divina, uma intuição, o líder dos colonos declarou que aquela era a terra destinada para as suas vidas. Tiveram que dar duro, já que essa tinha sido uma região de plantio de café, anteriormente, o que castigou e esgotou os recursos da terra. Depois disso, a área foi usada para a criação de gado, o que terminou de castigar o solo. Encontraram, dessa maneira, uma terra pobre, uma área completamente desmatada e um grande isolamento. Replantaram as árvores e passaram, pouco a pouco, a receber amigos, visitantes e a incrementar o turismo na região, atividade responsável, hoje, pela sustento da economia de Penedo. Toda a história da colonização, árvore genealógica dos primeiros colonos, roupas, costumes, danças típicas, podem ser conferidos no Museu Finlandês, que fica na rua principal da cidade.

Nosso primeiro passeio de reconhecimento da cidade nos levou a um charmoso e agradabilíssimo antiquário, o Country Inn Antiguidades. Lá você encontra de obras de arte a mobílias antigas (fiquei completamente apaixonada por um guarda-vestido, século XIX, espelho oval bisotado na porta, preço razoável de R$800,00), passando por louças de porcelana chinesa, objetos de prata, artesanatos da região. Vale a visita. Só esteja preparado para preços que não são lá pechinchas. Além disso, ainda não estava trabalhando com cartões de crédito.

Mais uma caminhada e nos vimos frente a frente com a Casa do Chocolate. Esse lugar pode ser uma verdadeira perdição se você anda (como a maioria da população ocidental) brigando com a balança. Lá tem sorvetes, doces em compota, doces de leite, balas, cachaças, queijos e chocolate, muito chocolate! Mas, confesso, mesmo sendo amantes inveterados desse doce que desperta paixões e compulsões incontroláveis, nossa parada por lá tinha outro objetivo. Soubemos da existência de um pico perto, o Pico do Penedinho, que fica em uma propriedade particular e que precisa de uma autorização pra subir. Autorização essa que é conseguida justamente na Casa do Chocolate (que fica na rua principal da cidade). Apesar do calor estar de rachar, de já passar das duas da tarde, não tivemos dúvida. Pegamos a autorização e pé na estrada.

Se você estiver a pé (como nós estávamos), prepare-se pra uma caminhada, em ascendência, de quase dois quilômetros. Isso até a entrada da propriedade e do início propriamente dito da trilha. A subida é fácil e tranqüila. Leva de 20 a 30 minutos e não é muito íngreme. No meio do caminho tem uma fonte, com água geladinha e potável. Bom pra dar uma refrescada, já que o caminho é praticamente todo feito embaixo de sol, sem árvores.

O topo tem uma vista de quase 360° de Penedo. Dá pra se ter uma boa idéia do tamanho da cidade, avistar as colinas, as casinhas com ar europeu, as ruas bem cuidadas e arborizadas. Parece uma cidadezinha de brinquedo, dessas que povoam nossas imaginações quando ainda somos crianças.

E criança é como nos sentimos quando nos deparamos com a Casa do Papai Noel, já de volta à rua principal da cidade. É verdade, Papai Noel mora aqui. Ou pelo menos tem uma casa de veraneio. Se para adultos é um sonho, para as crianças é um verdadeiro delírio. Imperdível.

Outra parada obrigatória, é a Cachaça com Arte, uma lojinha recém aberta que tem cachaça de tudo quanto é sabor e procedência, oferecendo a oportunidade de degustação de vários tipos diferentes da bebida. Um estímulo para paladar e olhos, já que o “Arte” do nome, fica por conta dos quadros, todos com inspiração na cidade, pintados ali mesmo pelo dono do estabelecimento, Isaque.

Foi lá no Cachaça com Arte que conseguimos a dica da pousada Boa Vista, localizada no alto de uma colina. A pousada é honesta, tem um café da manhã caprichado, uma vista realmente boa, piscina (pra quem quiser dar uma refrescada), e nos custou R$89,00 a diária pro casal, um bom preço para a média de preços da cidade. Pra quem procura uma pousada com maior infra, com pensão completa e oferecimento de atividades, existem inúmeras opções, com preços de mais ou menos R$150,00 a diária do casal. Vale a pena pesquisar e negociar.

Depois de um dia movimentado e com grandes e longas caminhadas, fui pega pelo pé por um cansaço que me derrubou. Tive uma desidratação que me deixou de cama na pousada, tomando soro e relaxando. Tomzinho, que não é de ferro, mas que tem uma resistência hercúlica pra mim, estava ótimo e precisava comer. Me deixou no quarto (com minha total conivência e estímulo) e foi jantar em um restaurante perto. Quase me matou de inveja ao relatar como havia sido degustar a “melhor truta da minha vida” (palavras dele). Era uma truta com molho de maracujá e batatas cozidas. De sobremesa, petit gateau de chocolate. Preços? Muito bons, algo como R$16,00 a truta e R$7,00 o gateau. Voltou para o quarto com um sorriso beatificado.

O dia seguinte foi de estréia para Tom. Ele, que nunca tinha andado a cavalo na vida, ficou entusiasmadíssimo com a possibilidade de se transformar, de uma hora pra outra, em um verdadeiro cowboy. Existem vários ranchos que alugam cavalos e oferecem passeios com guias. Dá pra ter uma hora e meia de passeio no campo ou em mata fechada, em cavalo bem tratado e mansinho, com direito a parada pra fotos e boa prosa com o guia. O preço é R$35,00 por pessoa e foi um dos pontos altos da viagem. Escolhemos o passeio em campo aberto, mais fácil e menos trabalhoso. As vistas são espetaculares. Passamos por lugares onde o vestígio de civilização mais próximo ficava a pelo menos 1 km de distância. Do resto era campo, colinas, céu estupidamente azul e a cadeia de montanhas ao fundo.

Voltamos para o Rancho From Penedo empolgados com o passeio, com a promessa de que voltaríamos pra fazer um passeio-enduro. Uma caminhada a cavalo de dois dias de viagem. Algo pra cowboy nenhum (seja cowboy urbano ou não) botar defeito.

Era hora de voltar. Mas o ônibus que sairia pro Rio ainda demoraria pelo menos umas 4 horas pra sair. Pegamos, então, uma van na rua principal de Penedo que nos levou ao Shopping Graal, em Resende, por R$1,60 a passagem. Lá compramos um bilhete para o Rio, na mesma empresa da ida. R$36,00 cada passagem. Como ainda tínhamos uns trinta minutos de espera, almoçamos no grande bandejão de comida a quilo do shopping. Os preços não são absurdos, a comida é razoavelmente honesta e pode-se comer com relativa rapidez. Meu conselho é ficar longe das lingüiças e saladas feitas com maionese. Cuidado apenas preventivo, já que se está próximo a embarcar numa viagem de 3 horas ininterruptas dentro de um ônibus dessa vez sem ar condicionado e com um calor de rachar. E como trata-se de comida pronta e exposta, todo cuidado é pouco.