quinta-feira, julho 14, 2005

o monstro do armário


Confesso que tenho um problema com o armário da cozinha. Na verdade o problema não é bem com o armário, mas com o que pode estar escondido dentro dele. Explico. Logo que vim morar aqui, alguns seres antenados, com asas e aparência asquerosa moravam dentro dele. Coloquei iscas, venenos, inseticidas... mas ao lidar com um ser capaz, dizem as más línguas, de suportar uma guerra nuclear, todo cuidado é pouco. E, apesar do momentâneo sumiço das mesmas, todas as medidas de extermínio acabam me parecendo vãs.
Um outro detalhe que me deixa assim, digamos, aterrorizada, é que as (eca!) baratas, só atacam de noite, de preferência durante a madrugada, quando vago insône e solitária pelos cômodos da casa. E aquele lanche madrugueiro, aquela fome irresistível, que só os com tendência a morcego conhecem, passa a ter um ar de aventura, de perigo, de uma ocasião de vida ou morte.
Tenho passado por isso de forma bastante heróica e sem grandes sobressaltos. Fazia tempo que não me deparava com nenhum monstro noturno. Tava quase acreditando, enfim, em paz doméstica. Mas ontem ao abrir, não sem cuidado mas já um tanto relaxada, a porta do armário, vejo aquilo correndo, fazendo um barulho de floc floc entre os mantimentos. Era grande, enorme diria. Escura, mal-encarada, cascuda e pronta a voar na minha jugular. Quando me viu ficou parada me observando. E eu congelada, inerte, apavorada com sua presença e seu olhar penetrante. Tive medo de me mexer e ela me atacar impiedosamente.
Ficamos assim, nos estudando por alguns instantes. Instantes esses que pareceram uma eternidade.
Lutei contra o meu medo, resolvi com toda a racionalidade que me foi permitida, que tentaria, que não entregaria os pontos, que brigaria até a morte se fosse necessário! Tentei pensar rápido e agir com mais velocidade que ela. Sem deixar de encara-la um só instante, com movimentos lentos e estudados, me afastei delicada e suavemente até alcançar um chinelo. Droga. Não tinha nenhum por perto. Tive que apelar ao meu bom, velho e guerreiro allstar vermelho, que tantas e tantas vezes esteve comigo, dançando, caminhando, na chuva, no sol e agora na árdua tarefa de matar uma barata. Voltei quase como uma felina, pé ante pé, quase sem respirar, tentando elaborar um plano rapidamente, pois sabia que meu tempo estava se esgotando. Ela não iria ficar parada a vida toda.
Em um movimento brusco afastei a lata de pó royal que estava dando cobertudra à inimiga!! Mas ao ver o seu corpo se mexendo, suas patas rápidas em minha direção, fui tomada por um espasmo de terror e imediatamente fechei os olhos e dei com o allstar em cima do saco de feijão!! Falhei. E ela floc floc floc correndo para os confins do armário escuro e úmido!! Vitória dela. Eu, totalmente patética e atônita no meio da cozinha, allstar na mão, ainda pude ouvir suas gargalhadas de barata ecoando pelos encanamentos...