sexta-feira, maio 20, 2005

a Amiga

A Amiga é amiga desde o primórdio dos tempos. É uma amiga dinossáurica. Literalmente, já que a amizade começou no meio de uma pesquisa sobre dinossauros. Oito ou nove anos de idade. Tudo realizado e sacramentado na bancada do atelier de mamãe, um quartinho com porta de vidro, que cheirava a resina e a chifre de boi prensado, localizado no terraço da casa em que morávamos. E tudo regado a um bom e doce suco de caju.
Ficamos inseparáveis. Nos víamos diariamente na escola e fora dela, andando de bicicleta, brincando de barbie, compondo músicas e escrevendo contos e peças teatrais. Éramos uma dupla, um par, as Amigas.
No princípio eu era a irmã mais velha. Já tinha morado em tantos e tantos lugares diferentes e ela sempre ali, no mesmo lugar. Tínhamos famílias muito diferentes e eu respondia às suas perguntas, no auge da minha sabedoria infantil. Ensinava tudo, achava que sabia tudo. E íamos vivendo assim.
Foi ela a primeira saber (e por muito tempo a única) do meu debut sexual. Dois meses depois, foi o dela, encorajado logicamente por mim. Namoramos no mesmo período, nos parecíamos fisicamente, viajávamos juntas... unha e carne!
Aí veio a faculdade e o meu casamento. Tivemos um afastamento inevitável. Ela viajou, estudou, trabalhou. Eu estudei, trabalhei, vivi minha vidinha de casada. Eu virei a certinha e ela a porra-louca.
Sempre foi avoada, esquecida, doida mesmo. Inteligentíssima, mas nunca capaz de lembrar de uma piada inteira. Quando muito, contava o final no início da piada. E ria. De perder as forças.
Lembro dela, ainda criança, chegando lá em casa com uma cara estranha. Dizendo que tava com dor na cabeça. Minha mãe chegou e perguntou: que foi, minha filha? E ela, meio sem graça e quase chorando: é que eu pensei que venho tanto aqui que podia fazer o caminho de olhos fechados... aí fechei os olhos e vim... mas bati com a cabeça numa árvore!!
Inútil dizer que passei mal de tanto rir!!
O tempo passou, a amizade continuou e fortaleceu. Hoje, com mais de vinte anos de convivência, de trocas, confidências, somos mais amigas do que nunca. Eu me separei. Ela casou. E continuamos nos ajudando, nos ouvindo, aprendendo a viver juntas, com nossas experiências. Ela é a Amiga. Sempre vai ser e, como já disse a ela, quero vê-la sempre bem, quero tricotar sapatinhos pros seus bisnetos. Porque, de verdade, eu amo muito a Amiga.